sexta-feira, 25 de maio de 2007

A discriminação de preços na Air France-KLM

Já imaginou alguma vez que no voo Paris-Bordéus, por exemplo, o seu vizinho de lugar, em classe económica, sem reduções especiais, pôde pagar um bilhete cinco vezes mais barato do que o seu? É pouco provável! No entanto esta ocorrência é mais frequente do que se pensa e tem mesmo um nome: “yield management” ou, melhor, “revenue management”.

Por trás desta denominação esconde-se um dos métodos mais secretos, mas igualmente um dos mais estratégicos de Air France. Um método que, desde há numerosos anos, contribui para os bons resultados da companhia aérea num contexto económico desfavorável. Bem aplicadas, estas técnicas de gestão dos lugares dos aviões encontram rapidamente a sua tradução financeira: num sector ultra-concorrencial, onde as margens são relativamente fracas, representam lucros na ordem dos 5 a 7 por cento do volume de negócios da empresa.

Uma companhia aérea como a Air France-KLM deve poder contar com a eficácia de todas as suas equipas para fazer partir os aviões a horas, fazer voar os seus clientes nas melhores condições possíveis, fidelizá-los. Mas, para o seu balanço anual, há um imperativo incontornável: é necessário não apenas encher os aviões o mais possível, mas sobretudo ao melhor preço. Bruno Matheu, Director Geral Adjunto, encarregado do marketing e das redes, resume a situação: “Os lugares de avião são um produto perecível. Um lugar vazio é um lugar perdido.“

Era necessário por conseguinte um método que permitisse maximizar a “receita avião”, jogando ao mesmo tempo com a taxa de ocupação e com a receita unitária por lugar, ou seja, o preço pago pelo passageiro. A Air France nada tem de pioneira na matéria: nos meados dos anos 1990, a companhia nacional apresentava mesmo, neste domínio, um certo atraso em relação aos seus homólogos americanos e europeus.

Era necessário agir rapidamente. Em vez de desenvolver um sistema próprio, aAir France optou por comprar um sistema nos Estados Unidos e a escolha recaiu sobre o desenvolvido por Sabre, um dos grandes GDS (global distribuition system). “O "software" é bom, mas há também o "know how" dos analistas de Air France”, felicita-se Bruno Matheu.

O funcionamento do revenue management consiste em fazer a melhor arbitragem possível entre a utilização da lotação e a receita unitária (o preço por lugar). Trata-se, num primeiro momento, de definir os níveis de preços e as condições associadas a esses preços (pricing) e, em segundo lugar, de determinar o número de lugares disponíveis em cada avião por classe de preços.

Mas não se consegue um pricing sem um estudo exaustivo da clientela: a direcção do marketing trabalha um grande número de dados, quer sobre a clientela de Air France, quer sobre a de outras companhias. Estes dados permitem analisar o comportamento de compra, relativamente às datas de reserva, a duração da estada, a altura da viagem, a possibilidade de reembolso. Sem estar a negligenciar, claro, a política tarifária da concorrência, estando pronto para reagir em tempo real se esta ou aquela companhia aérea apresenta o mesmo voo a um preço mais atractivo.

Num voo de ida e volta entre Paris e Nova Iorque no mês de Abril de 2007, em cabina Tempo (classe económica), os bilhetes iam assim de 467 a 3.228 euros.

O "corre mundos", de acordo com a tipologia da companhia aérea, escolherá sobretudo uma tarifa L a 467 euros, incluindo todas as taxas, barato mas cheio de restrições. Esta tarifa está com efeito disponível até trinta dias antes da partida, impõe um domingo no destino, uma estada máxima de um mês, é trocável antes da partida, embora com despesas, mas não se pode alterar a data e a hora de regresso nem mudar de companhia (não é "inter-linhável"). Não é igualmente reembolsável e não permite viajar por etapas (stopover).

Vem seguidamente o "turista". Por 887 euros, a tarifa H está disponível até sete dias antes da partida, mas o domingo deverá ser imperativamente passado no destino e a estada não deverá exceder dois meses. O bilhete é trocável antes da partida, com despesas, mas, contrariamente à tarifa L, é possível alterar a reserva do regresso, mediante despesas.

No topo da escala de preços da cabina económica, há a tarifa a 3.328 euros… Não é nem a tarifa da primeira classe nem mesmo a da classe negócios, mas o preço da liberdade total. É, na tipologia da Air France, a tarifa que pode pagar-se o “executivo”. Com o mesmo serviço a bordo que o bilhete a 467 euros, e o mesmo posicionamento na cabina.

A diferença está no resto: ausência de data-limite para a compra, podendo ser feita no dia da partida. Ausência de estada mínima ou máxima. O bilhete é igualmente trocável, reembolsável, inter-linhável sem encargos, e permite mesmo uma mudança de reserva gratuita no regresso. No total, há nove classes tarifárias na cabina Tempo.

Uma segmentação existe igualmente na classe de negócios. Existem nada menos do que cinco tarifas, com o mesmo corolário: maior a liberdade de mudança (horários, data, reembolso), mais a elevada se revela a tarifa. Idem em primeira classe, onde há três categorias de reservas. Finalmente, entre todas as classes, existem 17 tarifas possíveis para um voo de ida-e-volta entre Paris e Nova Iorque, indo de 467 euros a 8.736 euros, ou seja, praticamente uma relação de um para dezanove…

Resta ao analista atribuir, em função dos períodos de ponta ou mortos, o número de lugares por tarifa. A afectação depende do tipo de tráfego esperado, ou seja, mais simplesmente, da ocorrência do que se chama, em gíria aérea, as "baixas, médias e elevadas contribuições".
Em dois voos com destino a Nova Iorque de segunda-feira dia 21 de Maio, a distribuição variava assim em função da hora de partida. No voo AF 022 de 8 h 25, os especialistas tinham previsto um fraco tráfego de negócios e, pelo contrário, um forte potencial de lazer. Consequentemente, 55% dos lugares eram acessíveis na tarifa mais baixa da cabina Tempo. Neste voo, apenas 14% dos lugares estavam atribuídos às classes de "elevada contribuição", na dianteira do aparelho.

Em contrapartida, nesse mesmo dia, no voo AF 006 de 13 h 15, cujo forte potencial do motivo de negócios é provado, nenhum lugar estava acessível na tarifa mais baixa da cabina Tempo. E 22% dos lugares estavam atribuídos às tarifas de gama elevada.

No mesmo voo AF 006 de 13 h 15, mas no dia seguinte, terça-feira dia 22 de Maio, a cabina já não era a mesma. Os analistas consideraram que o voo tinha um forte potencial de tráfego por motivo de lazer. Consequentemente, 28% dos lugares estavam acessíveis à tarifa mais baixa da cabina Tempo. E as classes tarifárias baixas e médias eram as mais numerosas.

Na Air France, entre os gestores de voos e os "pricers", especialistas dos preços, mais de 200 pessoas trabalham sobre uma imensa plataforma que se assemelha, traço por traço, a uma sala dos mercados financeiros. Aqui, o título bolsista é substituído por uma linha e um destino. E todos os elementos susceptíveis de influenciar a procura são tidos em conta: férias locais, competições desportivas, meetings políticos…

Todos os analistas conhecem perfeitamente o seu destino. O especialista dos voos entre Paris e Nova Iorque sabe bem que a maratona da cidade tem lugar cada ano no primeiro fim-de-semana de Novembro e que os corredores franceses deslocam-se em grupos. Do mesmo modo, as grandes reuniões ou cimeiras na sede das Nações Unidas serão um bom indicador para a cabina de negócios.

É assim que, lugar a lugar, se constrói o lucro da Air France.


François Bostnavaron, “Le vol Paris-New York, c’est combien?”, jornal Le Monde de 24 de Maio de 2007, p.3.

sábado, 19 de maio de 2007

O oligopólio do livro escolar

O mercado do livro escolar português é oligopolista: 80% da quota de mercado está na posse de 3 empresas. E a concentração no mercado está a aumentar, na medida em que Miguel Pais do Amaral e o seu sócio holandês Nicolas Berggruen, proprietários desde o princípio do ano da Texto Editora, acordaram a compra da área escolar da Edições Asa. Aqueles investidores procuram ganhar dimensão e massa crítica com esta aquisição, segundo uma fonte próxima de Pais do Amaral, contactada pelas jornalistas que assinam a notícia do Público.

Qual pode ser o impacto sobre a edição de livros escolares e respectivo preço?

quarta-feira, 16 de maio de 2007

As coimas da AdC

Apenas duas das 22 empresas condenadas, em Portugal, por práticas concertadas pagaram as coimas aplicadas pela Autoridade da Concorrência. Em quatro anos de actividade, este organismo detectou cinco cartéis envolvendo mais de vinte sociedades, que condenou a desembolsar 29,4 milhões de euros pelos danos provocados no funcionamento da economia.

Deste total, apenas 2,3 milhões de euros foram, efectivamente, pagos à Autoridade pelas duas únicas empresas que assumiram o papel de arrependidas num processo de cartel (beneficiaram de reduções nos valores das penalizações). Tratam-se da Johnson & Johnson (J&J) e da Roche, acusadas de terem actuado em conluio com outras três farmacêuticas - Abbott, Bayer e Menarini - em concursos públicos para o fornecimento de tiras reagente (para determinar a glicose no sangue). A primeira investigação da AdC deu origem a um segundo processo (com base nas denúncias da J&J e no qual a Roche colaborou) e fez com os cinco laboratórios fossem condenados duas vezes por cambão.

As outras três condenações trouxeram à luz do dia a existência de um cartel de dez empresas do sector da moagem de farinha de trigo, um outro no sector do sal envolvendo quatro sociedades e, mais recentemente, foram apanhados três prestadores de serviços marítimos no Porto de Setúbal que fixavam preços e repartiam a clientela.

Dado os elevados montantes das coimas, em todos os processos houve recursos para as instâncias judiciais, o que faz com que o pagamento das coimas seja suspenso até uma decisão final por parte da justiça. Até agora só houve uma sentença de um tribunal português sobre um cartel. A decisão do Tribunal de Comércio de Lisboa manteve a condenação da Autoridade a todas as empresas envolvidas no cambão do sal, embora reduzindo as coimas (de 910 mil para 705 mil euros, no total). Ou seja, as empresas visadas têm que pagar as coimas à AdC assim que a sentença transitar em julgado.

Entretanto, do mesmo tribunal surgiram novidades desfavoráveis ao organismo presidido por Abel Mateus, quanto ao recurso interposto pelas farmacêuticas contra a condenação da concorrência. Esta instância judicial emitiu um despacho onde exige que a AdC corrija irregularidades formais na acusação. Caso a decisão judicial final venha a ser favorável para os laboratórios, a J&J e a Roche serão reembolsadas das coimas já pagas.

Abel Mateus disse ao Expresso que, na segunda-feira, entrou no tribunal um pedido de aclaração do despacho, “para que a Autoridade possa ver esclarecidos os argumentos aí aduzidos” e decidir se corrige a acusação ou se recorre para o Tribunal da Relação. O presidente lembra que a AdC funciona “em colaboração estreita com o Ministério Público, que é a entidade que defende e representa a Autoridade em juízo” e garante que caso se confirme “a existência de alguma irregularidade processual sanável, ela será imediatamente efectuada. É essa a nossa responsabilidade na defesa do bem público”.

Abel Mateus encara “com o devido respeito o recente despacho emitido sobre as farmacêuticas”, mas faz questão de salientar que “estamos convencidos, pelas dezenas de recursos confirmados pelos tribunais, que já temos estabilizadas as regras processuais”.

Ao mesmo tempo recusa que as dúvidas levantadas pelo Tribunal do Comércio fragilizem a actuação da Autoridade, já que não se trata de uma decisão final “e não está em causa qualquer dos instrumentos essenciais para o exercício da actuação da Autoridade para fazer cumprir a Lei da Concorrência”. Além disso, frisa o presidente da AdC, “o Tribunal não absolveu as empresas arguidas nem sequer se pronunciou sobre os factos ou sobre os fundamentos da decisão, já que a validade do processo ainda não foi apreciada”. Por fim, Abel Mateus lembra que só é possível dissuadir os comportamentos que violam a concorrência e prejudicam os consumidores, “havendo um corpo de decisões e de jurisprudência que sancione efectivamente os prevaricadores”.


Ana Sofia Santos, "Cartéis não pagam coimas", Semanário Expresso nº 1802, de 12 de Maio de 2007, Suplemento de Economia, p. 12.

Perguntinhas
a) Quais são os sectores de actividade em que a Autoridade da Concorrência já instaurou processos, a empresas acusadas de concertação de preços?
b) Qual é a quantia das coimas já cobradas pela AdC? E a que falta liquidadar?
c) Qual foi o despacho desfavorável para a AdC, emitido pelo Tribunal de Comércio de Lisboa? Qual foi a correspondente reacção da AdC?
d) Quais são os objectivos da Autoridade da Concorrência (consulte o site da AdC)?

terça-feira, 8 de maio de 2007

Previsões da primavera para Portugal

Previsões da primavera para Portugal da Comissão Europeia, disponíveis aqui.